Vereadora de Toritama, Carol Gonçalves (PSDB) Crédito: Reprodução / Instagram
Texto Giovanna Carneiro
No
dia 10 de setembro, o diretor de feiras do município de Toritama, no Agreste de
Pernambuco, José Claudemir de Oliveira – conhecido como Sinal – teve sua
prisão preventiva decretada por ataques contra a vereadora Carol Gonçalves
(PSDB). O funcionário público ficou detido no presídio de Santa Cruz do
Capibaribe por dois dias e o caso foi considerado “crime de violência
eleitoral”. Agora, o processo judicial que pode se tornar a primeira condenação
por violência política de gênero em Pernambuco corre em segredo de
Justiça.
De
acordo com dados do Relatório Monitor da Violência Política de Gênero e Raça,
lançado pelo Observatório Nacional da Mulher da Política, da Câmara dos
Deputados, em parceria com o Instituto Alziras e a Agência Francesa de
Desenvolvimento, o Brasil teve apenas duas sentenças de condenação pelo crime
de violência política de gênero. Além disso, uma em cada quatro representações
de violência política de gênero entre 2021 e 2023 foi arquivada ou
encerrada.
Carol
Gonçalves, de 28 anos, foi eleita em 2020 com 770 votos. Na ocasião, era
filiada ao Movimento Democrático Brasileiro (MDB), mesmo partido do prefeito
Edilson Tavares. No entanto, em 2023, a parlamentar mudou de partido, passando
a integrar o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), e se tornou
oposição na Câmara Municipal. Desde então, Gonçalves afirma que passou a ser
alvo de ataques.
“Desde
quando eu rompi com o governo, que tentou cassar meu mandato, eu tenho sido
alvo de diversas situações. Inventam mentiras com o meu nome, memes na internet
e nos grupos de WhatsApp afirmando que eu sou usuária de drogas, usam minhas
fotos para fazer montagens e fazem todo tipo de xingamentos e apelidos,
zombando com minha aparência, me chamando até de macaca”, contou a vereadora,
que é candidata à reeleição.
Ainda
de acordo com Gonçalves, os ataques se intensificaram no início do período
eleitoral, a ponto dela temer por sua segurança e comprometer sua agenda de
campanha.
Em
março de 2023, Paulo Tavares (MDB), segundo suplente da legenda partidária,
protocolou um processo de cassação contra Carol Gonçalves no Ministério Público
de Pernambuco, alegando que a parlamentar havia viajado para o exterior sem ter
avisado previamente à Câmara Municipal e utilizado recursos públicos para
gastos pessoais. Na ocasião, Gonçalves foi até o México representar a cidade de
Toritama como palestrante no Fórum Global pela Democracia. Em julho de 2023, o
Ministério Público de Pernambuco arquivou o caso, que também foi rejeitado no
Tribunal Regional Eleitoral (TRE).
Um
ano depois do arquivamento do processo de cassação, em julho deste ano, a
Justiça Eleitoral rejeitou uma acusação do prefeito Edilson Tavares (MDB)
contra Carol Gonçalves. O processo movido contra a parlamentar alegava a
realização de propaganda eleitoral em um prédio público e o uso de bens
públicos para fins eleitorais. A Justiça decretou a improcedência das alegações
contra Carol Gonçalves, isentando-a de qualquer penalidade ou multa, que
poderia chegar a R$15 mil.
Rede
de apoio contra a violência política de gênero
Carol
Gonçalves é uma das 40 parlamentares que integram a Rede A Ponte,
uma iniciativa que reúne especialistas em diversos temas de políticas públicas
com o objetivo de fortalecer o mandato de mulheres e aumentar a
representatividade feminina na democracia brasileira.
“A
nossa rede é composta por uma maioria de vereadoras do interior, porque a gente
entende que são essas mulheres que estão mais à margem do processo político,
são elas que necessitam muitas vezes de apoio jurídico e institucional e de
informações para protocolar Projetos de Lei, por exemplo, questões
orçamentárias também. Então nós atuamos para que essas mulheres possam ter
incentivo e autonomia em seus mandatos”, afirmou Lauana Chantal, coordenadora
de incidência política da Rede A Ponte.
De
acordo com dados do Tribunal Superior Eleitoral, no Brasil, as mulheres correspondem
a 18% do total de candidaturas eleitas na Câmara dos Deputados e apenas 7% no
Senado. Além disso, 995 câmaras municipais do país não possuem nenhuma mulher
eleita.
Um
dos fatores que contribuem para essa menor incidência de mulheres na política
institucional é a violência política de gênero, como aponta Lauana Chantal ao
comentar sobre o caso da vereadora de Toritama: “a gente tem várias camadas de
violência política quando a gente chega nas mulheres do interior, porque essas
mulheres estão em uma situação muito delicada em termos de segurança porque ela
vai denunciar muitas vezes o vizinho dela ou de algum parente, pessoas que
estão muito próximas”.
Chantal
conta também que ainda neste ano, a vereadora Carol Gonçalves tentou protocolar
um Projeto de Lei de combate a violência política de gênero na Câmara Municipal
de Toritama, mas o projeto foi vetado pelo prefeito, em julho. “Carol já vem
sofrendo violência política desde muito cedo na Câmara por conta da sua atuação
e seu enfrentamento político”, enfatizou a coordenadora.
Em
agosto de 2021 foi aprovada a Lei nº 14.192, que alterou o Código Eleitoral e
tornou crime a violência política de gênero. A norma, que pretende assegurar a
participação de mulheres em debates eleitorais e criminaliza a divulgação de
fatos ou de vídeos com conteúdo inverídico durante a campanha eleitoral,
estabelece regras jurídicas para prevenir, reprimir e combater a violência
política contra a mulher nos espaços e nas atividades relacionadas ao exercício
político.
Para
a coordenadora da Rede A Ponte, a resolução do caso da vereadora Carol
Gonçalves pode abrir precedentes para que a Lei nº 14.192/2021 seja utilizada
com mais rigor: “a gente está dando todo suporte e apoio a Carol. A gente faz
com que ela permaneça no cargo, mas também que a violência que ela sofreu não
fique impune, que isso seja uma resposta não só para o caso dela, mas para
outros casos, que outras parlamentares vêm sofrendo, e que isso se torne um
precedente para que nenhuma outra mulher venha sofrer violência política de
gênero e raça em função do seu trabalho”.
“Quase
100% das parlamentares da nossa rede já sofreram violência política de gênero e
raça, só que nem todas chegaram a denunciar. E muitas que denunciam optam por
não seguir com o processo por medo de sofrer ainda mais retaliações ou nem
sabem como fazer a denúncia porque é um processo tão burocrático. A gente
precisa ter um passo a passo mais bem demarcado, saber qual delegacia procurar,
quais provas e evidências precisamos ter para apresentar a denúncia, várias
questões que ainda não estão bem colocadas”, concluiu Chantal.
Atualmente,
a Rede A Ponte presta assistência jurídica e parlamentar para 29 vereadoras e
11 deputadas estaduais, destas, 60% são mulheres negras.
Desde
2021, o Ministério Público Federal (MPF) possui um canal para receber denúncias de
todos os tipos. De acordo com o MPF, desde a abertura do canal, já
foram recebidos 215 casos de violência política de gênero, em sua maioria,
denúncias de ofensas, transfobia, exposições, violência psicológica, sexual e
moral.
marcozero.org